quinta-feira, 1 de maio de 2014

O apelo de uma trabalhadora trans no Dia do Trabalho

1º de maio. Dia Internacional do Trabalho.

Esta data foi escolhida por ter sido o dia em que se iniciou um levante de trabalhadores nos Estados Unidos, que começou na cidade de Chicago em 1886. Eles pleiteavam a redução da jornada da trabalho, que em alguns ofícios chegava a 16 horas diárias, para 8 horas diárias. O primeiro país a reconhecer a data como um marco da luta dos trabalhadores por melhores condições foi a França, em 1919.

Pois bem, 128 anos se passaram desde o levante em Chicago. E ainda há uma série de lutas a serem empreendidas pelos trabalhadores.

O Brasil hoje é comandado por uma presidente que pouco caso faz à luta dos trabalhadores, que ironicamente compõem o nome de seu partido, e nossa "representação popular" é de deputados e senadores que sempre legislam em causa dos empregadores que fazem de tudo para tirar os direitos conquistados desde que foi editada a Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943. Como parte dos quadros do funcionalismo público, presenciei em 2012 uma greve geral de dimensões inimagináveis nesses últimos anos de governo de centro-esquerda.

E muito pouco ou mesmo nada foi feito pela inclusão no mercado de trabalho de pessoas como eu, como alguns dos meus leitores, que convivem com outra luta: a luta pelo reconhecimento de sua identidade.

Não tenho como fechar os olhos para alguns avanços que aconteceram, a maioria deles no setor público:
- Alguns Estados aprovaram o reconhecimento ao nome social das pessoas trans nas repartições e nos serviços públicos, em especial na saúde. Em São Paulo, pode-se citar o Decreto Estadual 55.588 e o Decreto Municipal 51.180, que dispõem sobre o uso do nome social em serviços públicos no Estado e na Capital, além da Lei Estadual 10.948, que pune a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero.
- Portarias federais reconheceram o direito ao nome social: a Portaria 233/2010, do Ministério do Planejamento, que trata do uso do nome social dos funcionários do Executivo Federal nas repartições, a Portaria 1820/2009, do Ministério da Saúde, que regulamenta o uso do nome social pelos usuários do SUS, e a Portaria 1612/2011, do Ministério da Educação, que regulamenta o nome social em atos daquele Ministério, e serviu de base para o reconhecimento ao nome social pelas universidades federais.
- Diversos projetos de lei tentam resguardar à população trans o direito a expressar sua identidade de gênero com dignidade. Podemos citar o 728/2011, da Assembleia Legislativa de São Paulo, de autoria da deputada Leci Brandão (PCdoB), sobre o uso do nome social nos registros das escolas estaduais, e aquele que atualmente é o projeto mais moderno, o 5002/2013, a Lei de Identidade de Gênero, ou Lei João Nery, de autoria de Jean Wyllys (PSOL/RJ) e Érika Kokay (PT/DF).

Mas ainda temos um terreno extremamente hostil à efetiva inclusão das pessoas trans no mercado formal de trabalho. Elas são muitas vezes jogadas para o subemprego, a prostituição ou a marginalidade, vítimas do preconceito, da estigmatização, da invisibilidade.

Aquelas que por uma ousadia se destacam, como a professora cearense Luma Andrade, a delegada goiana Laura de Castro Teixeira, e como não citar atrizes e modelos de renome nacional e internacional como Maria Clara Spinelli, Maitê Schneider, Lea T e Carol Marra, são alçadas a uma categoria de "curiosidade" pela mídia. Assim como tantas outras anônimas, que diariamente convivem com invasões à sua intimidade, pelo mero desconhecimento do que é ser trans e conviver todo dia com a opressão institucionalizada.

O meu apelo, meu, de Marina Rodrigues, trans, funcionária pública, e acima de tudo, cidadã brasileira e contribuinte de impostos, é muito básico.

Apelo para que nós, pessoas trans, possamos trabalhar, dignamente, honestamente, tratadas de igual para igual, sem privilégios ou deméritos, sendo consideradas apenas como o que somos: pessoas, humanas, cidadãs, hábeis, aptas, trabalhadoras.

FELIZ 1º DE MAIO!


Foto: Ato público de 1º de Maio. São Bernardo do Campo, 1 maio 1980. Ricardo Alves. Acervo Arquivo Edgard Leuenroth

Um comentário:

Gugu Keller disse...

Parabéns pelo teu desabafo! Corajoso e muito bem escrito!
GK