domingo, 30 de junho de 2013

Rompendo com a passabilidade

Um termo muito comum no meio trans é a tal da "passabilidade", a capacidade de se parecer o máximo possível com a apresentação social que se espera do gênero oposto. Pois bem, nesse quesito, há um espectro muito grande de rotulações: as que são praticamente uma mulher, as muito femininas mas não tanto, as que você vê que têm algo um pouco diferente, as que têm caracteres masculinos quase estampados na testa, e por aí vai.

Um dos meu grandes medos no início da transformação foi esse, o de "não convencer", de ficar com uma feminilidade "artificial". É um sentimento comum entre @s trans, acho. A aversão ao gênero anatômico chega a um nível tão insuportável que um mínimo traço dele na composição é capaz de acabar com a autoestima da pessoa. Tenho traços mais femininos que masculinos, o que pode ser uma sorte, ou quem sabe não.

Romper com essa preocupação excessiva de "parecer" mais, ou menos, é tarefa quase que impossível. A visão falocêntrica do que é o feminino nos leva a extrapolar nossas capacidades para sermos "aceitas" como femininas tal e qual. E isso é ruim. Porque nossa transformação passa a ser feita apenas em função do parecer de outras pessoas, ao invés do nosso próprio conforto.

Ao momento em que a transformação é feita em nosso próprio ritmo, respeitando os nossos limites psíquicos e até mesmo orgânicos, a "passabilidade" passa a ter uma importância muito menor, deixando de ter o status de "meta a ser perseguida" e passando a ser "consequência bem-vinda".

Vídeo da noite: Azis - Sen Trope

A primeira vez que eu vi esse vídeo, o choque visual e de realidade foi tão grande que a primeira coisa que me perguntei foi "Que p. é essa"? Passado o susto inicial, achei algo inusitadamente interessante. Eu não consigo fazer uma descrição sobre o búlgaro Azis (representante da tchalga, um ritmo que mistura pop, eletrônico, ritmos balcânicos, e numa menor escala, algo meio turco, enfim, uma gororoba musical), portanto, deixo o clipe para que vocês tirem suas próprias conclusões.


sábado, 29 de junho de 2013

[OFF] Síndrome do orgasmo pedicular

Vamos falar sobre orgasmo? Esse foi um caso registrado na Holanda de uma mulher que sentia contrações semelhantes às do orgasmo no pé esquerdo. Vamos ver.

Um orgasmo no pé é real? Primeiro caso conhecido relatado por mulher na Holanda

Do Huffington Post (livre tradução)

Uma mulher de 55 anos na Holanda visitou o médico com uma queixa incomum: ela experimentava indesejados orgasmos que começavam no pé dela, de acordo com um novo relatório.

As sensações orgásmicas - que aconteciam no seu pé esquerdo - eram repentinas, não trazidas por desejos ou pensamentos sexuais, e aconteciam em média cinco ou seis vezes por dia, disse o relatório. A sensação percorria sua perna esquerda em direção à sua vagina, e ela disse que a experiência era igual à de um orgasmo atingido durante o sexo.

Estes orgasmos eram muito constrangedores e preocupantes para a mulher, disse o autor do estudo, Dr. Marcel D. Waldinger, que tratou a mulher e é neuropsiquiatra e professor em psicofarmacologia sexual na Universidade de Utrecht.

"Ela se sentia terrível em relação a isso", disse Waldinger.

Imagens de ressonância magnética do cérebro e do pé da mulher não mostraram anormalidades, porém outro teste revelou algumas diferenças entre os nervos do seu pé esquerdo e os do seu pé direito, Waldinger disse à LiveScience. A estimulação do seu pé esquerdo com uma corrente elétrica induzia um orgasmo espontâneo naquele pé, ele disse.

A mulher foi tratada com uma injeção de anestésico em um dos seus nervos espinhais - o nervo que recebe informações sensoriais de seu pé - e os orgasmos cessaram completamente. A mulher não teve nenhum orgasmo no pé passados oito meses, porém ela deverá tomar outra injeção de anestésico caso os sintomas retornem, disse Waldinger.

Os pesquisadores acreditam que o fenômeno foi o resultado de uma espécie de confusão no cérebro.

Cerca de um ano e meio antes de os orgasmos iniciarem, a mulher passou três semanas em uma unidade de tratamento intensivo - parte do tempo, em coma - devido à uma septicemia (infecção generalizada por bactérias). Quando ela saiu do coma, tinha sensações de formigamento e queimação no pé esquerdo, provável resultado de um dano a pequenas fibras nervosas no pé, segundo Waldinger.

Interessantemente, o nervo que registra informações sensoriais do pé entra na medula espinhal no mesmo nível que o nervo que registra informações sensoriais da vagina, segundo Waldinger. Em razão da falha no nervo do pé, o cérebro da mulher não recebia as informações sensoriais do pé, porém recebia as da vagina.

Após um ano e meio, o nervo no pé se regenerou. Quando isso aconteceu, os pesquisadores acreditam que "o cérebro não conseguia mais diferenciar o pé e a vagina, e então decidiu que qualquer estímulo vindo do pé na verdade vinha da vagina", disse Waldinger. "E isso significa uma sensação orgásmica no pé", segundo ele.

Os pesquisadores chamaram a disfunção da mulher "síndrome do orgasmo pedicular", e este é o único caso conhecido desse tipo. (Um orgasmo no pé foi diagnosticado anteriormente em um homem com um pé amputado)

Waldinger pensa que outras pessoas nessa condição devem existir, mas ficam muito constrangidas em falar sobre o assunto. Waldinger quis publicar o relatório do caso em parte para reduzir o estigma que envolve tais condições.

"Não é psicológico", disse Waldinger. "É uma coisa neurológica - podemos explicá-la, podemos tratá-la".

Waldinger espera mais pessoas que possivelmente estejam em condição similar, e criou um website para que as pessoas o contatem.

O estudo foi publicado online em 19 de junho na Revista de Medicina Sexual.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Vídeo: Irã, operação por necessidade ou por obrigação?

A médica hoje me pôs também duas colocações interessantes sobre as quais não dissertei no post anterior. A primeira foi sobre a troca de prenome, que pode ser conseguida mesmo sem a cirurgia de transgenitalização; neste caso muda-se apenas o prenome, mas o sexo anatômico continua lá no registro, coisa que só é mudada após a operação.

A segunda, que é a motivação deste post, foi a "pergunta do milhão" que ela fez: "Você quer fazer a cirurgia"? Respondi contundentemente: "Não sei". E não sei mesmo. Será que passar mais de oito horas numa maca sob uma intervenção arriscadíssima e dolorosa tem toda essa capacidade de transformar a minha vida?

E então me lembrei de um doc que vi publicado no blog da Denise Cristina, sobre as operações de transgenitalização no Irã, que foi exibido no GNT. Diferentemente do doc que eu havia postado anteriormente sobre o tema, este trata de um aspecto muito particular: pessoas que passam pela transgenitalização mesmo sem ter esse desejo.

Explicação: segundo as doutrinas da sharia, a lei islâmica, a homossexualidade é pecado (por conseguinte, crime) e é punida com a morte; porém o Irã não encontrou nada no Alcorão que criminalizasse a mudança de sexo. Muit@s então optaram por submeter-se à cirurgia, como forma de não serem vistas como "anormais" dentro da sociedade iraniana e não serem presas por "violação dos bons costumes" ao vestir-se com roupas femininas.

Algumas das entrevistadas no documentário dizem que se pudessem, não realizariam a cirurgia; estavam se submetendo a ela em respeito ao Islã. Vi o vídeo já faz um bom tempo, portanto não lembro se foi falado em índice de suicídios entre quem passa pela transgenitalização lá, mas creio que deve ser um valor alto.

Uma conclusão: esse é um dilema, e uma situação dolorosa, que só ficam em evidência quando um sistema religioso passa a reger o convívio social, adequando-o aos seus dogmas. A sociedade iraniana é prova cabal desta tese. A Turquia passa por conflitos sangrentos para evitar que isso aconteça por lá também. Nas Américas, o extremismo evangélico vai ganhando um espaço assustador e já mostrou o estrago que é capaz de fazer: desde a aprovação da Prop 8 nos Estados Unidos até o ridículo projeto da "cura gay" no Brasil.

Pois... ao vídeo, enjoy.


quinta-feira, 27 de junho de 2013

O patológico e o necessário

Hoje passei por mais uma consulta no ambulatório de transgêneros. Fui atendida por uma médica bastante simpática e firme nas suas colocações, nos apresentamos, eu passei meu quadro atual de medicações. Ela me fez perguntas sobre a minha "descoberta transgênera", e me lembrei de coisas das quais nem fazia ideia.

Os exames anteriores que eu havia feito, cujos resultados inclusive havia postado aqui, foram interpretados pela médica, que me acalmou dizendo que não eram preocupantes, e sim efeito dos estabilizadores de humor que tomo. A única exceção é a tireoide, essa sim num nível preocupante, com indicação de hipotireoidismo.

Farei novos exames e volto depois para ver os resultados.

Muito interessante foi um dos temas da conversa que tive com a médica: a chamada avaliação psicológica requerida pelo CRT. Sim, a que dá o diagnóstico de transexualismo. Muito leio e ouço sobre a campanha pela despatologização do transgênero, mas algo que a médica me disse hoje faz muito sentido: se o código F64 deixar de existir, deixa de existir também a obrigação de custeio de hormonoterapia e redesignação sexual pelo Estado. Ora, o SUS vai tratar o que não é doença?

Neste momento fiquei sem argumento. E voltei para casa pensando no embate entre despatologização e welfare. Será mesmo que ter um mínimo de dignidade é se sujeitar a ser "mentalmente desequilibrad@"? Despatologizar a transexualidade automaticamente vai torná-la um capricho? Questionamentos para os quais ainda não tenho resposta.

E fazendo aquele public service.... Se você, trans, que mora em São Paulo ou redondezas, precisa de acompanhamento em sua transição, procure o ambulatório de travestis e transexuais do CRT, que presta atendimento gratuito na área, como endocrinologia, distribuição de hormônios, fonoaudiologia, psicologia, e atualmente contam também com uma advogada que auxilia no processo de mudança de nome. Atendem super bem, mas as vagas são suuuuuuuuuuuuper concorridas. O endereço é:

Rua Santa Cruz, 81 - Vila Mariana
próximo ao metrô Santa Cruz
Telefone: (11) 5087-9911

O frio que vira frieza

As quedas bruscas de temperatura geram um fenômeno muito interessante em mim: a criogenização de sentimentos e emoções. Talvez não esteja tão à vontade com meu corpo, o que se reflete na psique, e por consequência, na afetividade. Fico mais esquiva, mais introspecta. As coisas parecem não me animarem, tampouco mudarem meu estado de espírito.

Uns poucos momentos de riso aqui e acolá, mas a frieza continua. A frieza, dura e congelante. Congelante até a mudança para um clima mais ameno, mais vivo, mais propenso a sentimentos mais alegres e a formas mais intensas de vida.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Hibridização

Todo mundo é feito de misturas.
Misturas raciais, culturais, psicossociais.
Todo mundo é um pouco híbrido, seja da maneira que for.
Em pensamento político, aquele neocon com um toque de pro-welfare.
Em hábitos alimentares, aquele que se enfarta de McDonald's e compensa com iogurte e granola.
Em vestimentas, aquele que tem grifes espalhadas pelo guarda-roupa mas não resiste a um passeio no Brás.
O que dizer então dos bipolares (aqueles que têm transtorno, não os "de modinha"), que alternam euforia extremada com depressão profunda?
É, somos todos híbridos.
Em nossos desejos, em nossos sonhos, em nossas visões, até em nossos sexos.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

O que a escola nos ensina

Dias atrás eu estava lembrando da minha época de escola, lá nos primórdios. E me veio a cabeça especificamente um livro que li acho que na terceira ou quarta série (atuais quarto e quinto ano). A princípio é um livro com uma história bem bobinha, típica de um livro infantil, mas sigam meu raciocínio.

A história era de dois irmãos, um menino e uma menina, que viram um arco-íris e não me lembro como resolveram atravessá-lo. Conseguiram e ao passar do arco-íris notaram que haviam "mudado de sexo". O resto do livro mostra a "agonia" dos dois com a nova situação, e ao final concluíram que só "voltariam ao normal" se atravessassem novamente outro arco-íris. Esperaram, e assim o fizeram, o menino voltou a ser menino e a menina voltou a ser menina, e foram felizes para sempre blá blá blá.

A discussão sobre o gênero me suscita algumas dúvidas sobre que tipo de mensagem livros como este passa às nossas crianças. Algumas interpretações: menino "virar" menina e vice-versa são anormalidades, coisas fantasiosas, que não devem ser levadas a sério (representação desta mensagem é a travessia do arco-íris); o dito "normal" é apenas o menino ser menino e a menina ser menina, e o que foge a essa concepção é terminantemente rechaçado (o inconformismo dos dois irmãos com a nova situação); e até mesmo a criação de um sentimento de aversão à diversidade sexual e de gênero (lembremos que o arco-íris é a bandeira do movimento LGBT).

Mais à frente, na sétima série (oitavo ano), quando a educação sexual, pelo menos nas escolas particulares, passa a ser um tema mais discutido, ainda que rasamente (a discussão ainda hoje se volta quase que totalmente ao tema da reprodução e das doenças sexualmente transmissíveis), vemos aquela discussão sobre a reprodução num ponto de vista puramente anatômico, tá, nasceu com pênis, é menino, nasceu com vagina é menina, o que gera as duas distintas "moldagens sociais". E os hermafroditas, são o quê? Qual será sua "moldagem social"?

Não poderia esperar mais, afinal venho de uma comunidade de criação extremamente cristã, sendo que desses cristãos, grande parte é evangélica, e entre os cristãos falar abertamente de sexo é algo de outro mundo, pecaminoso. As questões que ficam são: que novas abordagens em relação à sexualidade e à diversidade de gênero podem ser tomadas pelo sistema educacional? As abordagens existentes e as propostas podem influenciar comportamentos extremistas no presente ou no futuro próximo? Não tenho estas respostas. O espaço de ideias está aberto para contribuições.

Video da noite: Verka Serduchka - Dancing Lasha Tumbai

Nem só de loiras com seios de fora vive a Ucrânia. Verka Serduchka (nome artístico de Andrei Danilko) é um famoso transformista do seu país. Em tempos de tensão, nada como se divertir um pouco com essa apresentação marcante que ficou em segundo lugar no Eurovision Song Contest (o concurso europeu de música) no ano de 2007.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

O fim de uma pequena batalha (ou o início de uma grande cruzada)

Hoje se encerrou mais um capítulo da novela da minha mudança de nome no trabalho. Finalmente pude colocar no pescoço um crachá que agora me identifica como realmente sou. Foi o resultado de árdua insistência e creio que um dos poucos casos no Brasil, ao menos que eu saiba, pois como diz com muita razão Daniela Andrade, transgênero no Brasil é algo que não existe para a sociedade.


Foto: Sabrina Garcia

Essa é apenas uma partícula do ser social Marina, em constante construção e consolidação, e apenas a primeira de várias conquistas que estão por vir.

PS: na época que eu tirei a foto do crachá meu cabelo ainda era muito curto, então usei a peruca. O natural hoje tá um tanto bizarro provavelmente por causa da posição em que eu me encontrava.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Novidades

Oi, não esqueci deste blog. Só estava num conflito interior e fiquei em standby por um tempo.

Primeiro, conto que finalmente, depois de seis meses, meu e-mail na empresa estampa o nome Marina, e meu crachá novo está a caminho. Quem sabe ganhe um gás pra trabalhar, que estava precisando. A assinatura incongruente com o vocativo me corroía a alma mensagem a mensagem, e agora a situação se acertou.

Segundo, continuo antiquada. Coisas que fazia enquanto me "identificava", ou ao menos simulava me identificar, como "gay", hoje me fazem pouco sentido, ou até mesmo me dão repulsa.

Terceiro, consegui o que 20 em 10 mulheres SONHAM conseguir: reduzi a calça em dois tamanhos. Agora é só manter a alimentação pra calça continuar boa e eu não ficar com aquela cara anoréxica.